João Ferreira Rosa
No tempo em que Mário Soares foi Presidente da República, muita gente achava que ele “se portava como um Rei”…   

Não acho nada. Isso são os republicanos que querem aproveitar o prestígio da figura real para o transplantar para a República. Mas Reis a sério que se pareçam com o Mário Soares, não vejo nenhum! A verdade é mais mesquinha. Estes Presidentes chegam ao poleiro e andam ali durante cinco anos a tratar de ficar em Belém mais cinco, porque por lei só se podem lamber com dez anos. Fazem tudo para lá estar, com a família, mascarados de Reis e de Rainhas. Reis e Rainhas, não, que eles acham pouco: mascarados de Imperadorzinhos, como o Napoleão! Repare que, no Palácio de Belém, a maioria dos móveis é do estilo Império. É ali que eles se sentem bem, não é com o povo. E logo que lá chegam põem aqueles ares, aquelas poses de grandes senhores. Alguns até podem parecer mais sérios, mas acabam por ser todos iguais. Do Eanes diziam que era quase um Condestável, um militar muito honesto, muito patriota, o mais aproveitável daqueles militares todos do 25 de Abril. Se o Eanes era o melhor, então imagine-se o que eram os outros! Também eu acreditei que ele era capaz de mudar isto. Mandei-lhe três vezes uma carta, a dizer: “pelo que representa, de honestidade, de patriotismo, acho que vai ser o senhor a sugerir que se faça um referendo sobre a República, esse golpe de Estado executado por meia dúzia de malandros. E ficaria na história como o homem honesto que devolve ao país o seu regime natural”. Nunca respondeu à carta e disse-me depois que nunca tinha recebido. O Eanes é muito poucochinho. Eu é que, em dada altura, tal como muitos portugueses, achava que ele iria deixar obra. No fundo, este é um problema da República que não tem solução: a gente elege desconhecidos. O Rei, esse não nos engana: nós conhecemo-lo, somos da família.   

Não há Repúblicas boas?   

Não há uma República que se aproveite. Por exemplo, diz-se que depois da guerra a Itália se transformou numa bandalheira, com governos atrás de governos. Mas é preciso dizer que foi depois da guerra, mas foi depois da República Italiana! E a verdade é que a Família Real italiana foi vítima do Mussolini, que foi eleito pelos italianos e que o Rei teve de aceitar. Na Alemanha, a República é proclamada em 1918 e daí é que vem o Hitler! Na Grécia, o Rei opôs-se a ter o embaixador americano no Conselho de Estado e por isso foi derrubado por um golpe de coronéis. A Monarquia é o grande inimigo das ditaduras.  

Houve a chamada “ditadura de João Franco”…  

É inacreditável dizer-se que o Governo do João Franco era uma ditadura. Na verdade, era uma hipótese de se poder governar contra a bandalheira, numa situação muito parecida ou igual àquela que temos hoje em dia. Depois, com toda a confusão e terrorismo da I República, claro, veio o Salazar. Dizem que foi uma ditadura muito horrível, que prendia os opositores. Quantos estavam presos no 25 de Abril?, pergunto. Muito poucos. Bom, seja como for, antes prendê-los do que matá-los, que foi o que a I República fez. Em qualquer dos casos, nem a Primeira, nem a Segunda nem esta Terceira República têm nada a ver com o nosso povo, com as antigas liberdades da Monarquia Portuguesa, com a alma da nossa gente. Não há nenhuma Monarquia que tenha defendido tanto o povo como a nossa. Contra os grandes. Contra o abuso da Nobreza. Também por isto, é uma ingratidão Portugal ser uma República: é negar o valor dos nossos Reis. Em Portugal há a tradição de uma relação directa muito forte entre o Rei e o povo. O meu pai dizia que era caso único na Europa nunca ter havido aqui uma luta entre o Rei e o povo. Houve lutas entre o Rei e os poderosos, ou entre o povo e os poderosos. Entre o Rei e o povo, não há memória.   

  O 1º de Dezembro de 1640 trouxe-nos a Dinastia de Bragança…   

…Uma Dinastia fantástica. Embora, claro, no aspecto jurídico, os Felipes tivessem tido razão em achar que eram os Reis legítimos. E até nem foram nada maus Reis. Mas 1640 deu-nos a grande Dinastia de Bragança, hoje representada por D. Duarte Pio. Acho que o Senhor D. Duarte está na mesma posição do Rei D. João IV. E acho bem a posição que tem. Ele pôs-se à disposição do povo português, caso o povo português tenha a lucidez de lhe pedir para ser Rei. Tal como D. João IV. Aliás, diz-se que o Senhor D. João IV teve até certa relutância em aceitar a tarefa de ser Rei. O actual Duque de Bragança tem mais esse aspecto em seu favor: disse que está ao dispor do Povo Português, ao dispor de Portugal.  

E a presente Família Real?  

É uma Família exemplar – e seria na mesma, ainda que não fosse Real. É pena os portugueses não conhecerem melhor os Duques, os Infantes, a sua vida. Se conhecessem, sentiam-se inevitavelmente parte da família. A Monarquia, na sua simplicidade, é isso mesmo: sermos todos da Família Real. D. Duarte é um Senhor cultíssimo, honestíssimo, filho de gente honesta, um Senhor de grande bondade e pureza. A Senhora D. Isabel é também extraordinária, uma Senhora que ultrapassou todas as expectativas. É gente à séria, que já deu a Portugal uma belíssima geração de Príncipes.  

Conheceu os pais do Senhor D. Duarte?   

Muito bem. Deslumbrantes de simplicidade e nobreza. Conheci-os nos anos 50, quando o Salazar os autorizou a regressar à Pátria. O Senhor D. Duarte Nuno e a Senhora D. Maria Francisca voltaram logo que puderam, sabendo que lá fora estariam muito melhor e nada lhes faltaria. Apesar disto, vieram para Portugal, para uma espécie de exílio em São Marcos, onde os fui ver, num palácio gelado, sem condições. A República não os queria em Lisboa, preferia isolá-los. Os bens da Família Real estavam confiscados, para que não tivessem muito dinheiro. E sujeitaram-se a isto com o sentido de servir, vivendo naquela quase humildade, naquela simplicidade. Só Príncipes à séria, com séculos de dignidade em cima, é que aguentam.